segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

MEMÓRIA


Minha família anda longe,
com trajos de circunstância:
uns converteram-se em flores, outros
em pedra, água, líquen; alguns, de
tanta distância, nem têm vestígios
que indiquem uma certa orientação.

Tão longe, a minha família! Tão
dividida em pedaços! Um pedaço
em cada parte... Pelas esquinas
do tempo, brincam meus irmãos
antigos :uns anjos, outros palhaços...

Seus vultos de labareda rompem-se
como retratos feitos em papel
e seda. Vejo lábios, vejo braços,
 por um momento persigo-os;
de repente, os mais exatos
perdem sua exatidão. Se falo,
nada responde. Depois, tudo vira vento
e nem o meu pensamento
pode compreender por onde
passaram nem onde estão.
Minha família anda longe..

Minha família anda longe.
Reflete-se em minha vida,
mas não acontece nada;
por mais que eu esteja lembrada,
ela se faz de esquecida;
não há comunicação!

Uns são nuvens, outros, lesma...
Vejo as asas, sinto os passos
de meus anjos e palhaços
numa ambígua trajetória
de que sou o espelho e a história..

Murmuro para mim mesma:
"É tudo imaginação!"
Mas sei que tudo é memória...
(Cecília Meireles)

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